sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

... Raquel Seabra

Raquel Seabra, 28 anos, vive em Shangai.
É uma portuguesa pelo mundo na procura da realização dos seus sonhos.
Dá aulas de inglês, faz voluntariado num orfanato e prepara-se para o maior desafio de sempre: ser mãe adoptiva de um menino.
Uma conversa no nosso bairro inventado do Oriente, que prova que, o impossível não existe e que dificuldades são desafios que nos permitem crescer…
 
 
 
Há quantos anos vives em Shangai?
Eu vivo em Shangai desde Fevereiro de 2013… quase 2 anos… e o tempo passou a voar!
Como foste parar ao "outro lado do mundo”?
 
Para ser verdadeira contigo… nem eu sei bem… sei que não estava contente com a minha situação profissional em Portugal porque não tinha o horário qu
queria, não conseguia seguir em frente com a minha vida e decidi usar o Google para ver quais seriam as minhas hipóteses fora de Portugal… e a China apareceu muitas vezes nessa pesquisa. Vai daí, decidi arriscar! Enviei vários currículos para vários países e, dias depois, recebi uma resposta da Disney a tentar marcar uma entrevista pelo Skype (eu não estava mesmo a contar com esta! Eles pediam um nativo mas, o meu Currículo agradou-lhes) e, lentamente, fui passando as fases todas e, quando dei por mim, estava em Lisboa a pedir o visto para eles poderem marcar a minha viagem!...Um mês depois, estava aqui!...
 
Como foi o processo de adaptação a uma cultura e um país tão diferente do nosso?
 
Tudo começa no aeroporto...dizer adeus não foi nada fácil! Mas ,eu estava
entusiasmada com o meu novo projeto por isso entrei no avião com o coração super acelerado, com um misto de emoções muito confusas..
Por um lado, a tristeza de deixar a família, os amigos, a minha vida como eu a conhecia.. tudo ia ser diferente a partir daquele momento e eu sabia bem disso!
Por outro, eu também sabia que ia ser muito bom, pois o projeto era aliciante e ia ser uma aventura que me ia permitir finalmente ter alguma independência.
Quando cheguei ao hotel, onde passei as primeiras 3 semanas, a solidão tomou conta de mim… ‘caiu a ficha’ e percebi que estava num país onde não conseguia comunicar na minha língua, onde não conseguia ler os sinais…essa noite foi péssima, entre muitas peripécias, envolvendo internet a não funcionar, eu não conseguir dormir por causa da diferença horária… enfim…
Mas, no dia seguinte de manhã (bem cedinho, aqui na China - meio
da noite em Portugal) tive a minha primeira reunião, onde conheci as pessoas que se tornaram as minhas melhores amigas e o meu maior suporte!
Esse foi o momento em que percebi que não estava sozinha e que tinha pessoas que estavam na mesma situação que eu :) Então, o processo ficou bem mais fácil.
Passamos 3 semanas intensas de formação e, ao mesmo tempo a tentar
sincronizar sonos, visitas a apartamentos, perceber onde iríamos viver e como seriam as nossas novas vidas, as nossas rotinas.
 
Conta-nos o teu dia-a-dia... a que horas te levantas, o que comes ao pequeno almoço, como vais para o trabalho, que música ouves... fala-nos das tuas rotinas...
 
O meu horario de trabalho varia muito… por isso não posso dizer que tenha uma rotina muito bem definida…
Os meus dias de folga são à Terça e à Quarta, quando aproveito para visitar ao máximo a cidade… tenho aulas de Mandarim e faço voluntariado num orfanato. Durante a semana, só vou trabalhar de tarde. O meu dia começa com reuniões de pais/ planificações/ reuniões com a equipa com quem trabalho. Depois, os meninos chegam e dou as minhas aulas.
Durante o fim de semana, não há tempo para planificar ou ter
reuniões. Estes são os meus dias mais compridos e ocupados.
Vou sempre para o trabalho de metro.
Eu vivo a 5 paragens do meu local de trabalho e aproveito estes 40
minutos para ouvir musica ( americana e portuguesa), organizar a agenda, ver a minha “To do list” e , quando chego à escola, já
tenho as minhas prioridades bem estabelecidas.
No caminho de volta a casa,tento relaxar, ler os meus blogs, ouvir musica e conversar com amigos que vêm no mesmo metro que eu.
 
 
 
Que alterações fizeste na tua vida? Adoptaste uma dieta oriental como regime alimentar? És mais espiritual do que eras?
 
Em Portugal, eu vivia em casa dos meus pais e agora vivo sozinha. Por isso as, alterações foram muitas… Tive de aprender a fazer muita coisa que não fazia antes.
No que respeita à comida, sempre comi um pouco de tudo e não foi muito difícil… A coisa mais estranha que comi até hoje foi escorpião e, se queres que te diga, não foi mau :)
No que respeita à espiritualidade, sinto que cresci muito aqui!
Há influências muito grandes e sítios muito especiais aqui… sinto que, crescer sozinha trouxe-me maturidade e também um desenvolvimento espiritual.
Sei que, neste momento, estou aqui por um motivo e que estou no sítio certo.
Cada vez, me convenço mais disso.
 
 
Tu deixaste a tua família em Portugal e preparas-te para adoptar um menino que foi abandonado num orfanato onde fazes voluntariado... essa vontade faz parte de um crescimento interior? Vais mesmo avançar com a adopção? Sentes que estás preparada para este passo?
 
Em Portugal eu sempre fiz voluntariado, e aqui não ia ser diferente.
Procurei, uma vez mais no Google, por projectos de voluntariado em Shanghai e cheguei ao contacto com este Orfanato.
Eu vou lá todas as semanas, num dos meus dias de folga.
Conheci este menino, que foi abandonado por ser surdo (Entretanto, já fez a operação e já tem o implante coclear) .Neste momento, todas as segundas-feiras à noite, depois do trabalho, vou buscá-lo e ele passa comigo Terça e Quarta. Na quinta-feira de manhã, deixo-o lá novamente.
Não estou pronta, mas acho que ninguém está, quando se inicia um processo
desta natureza.
A adopção faz parte dos meus planos desde que sou muito nova e, neste momento, tenho a estabilidade profissional e financeira para avançar. Por
isso, tal como em tudo na minha vida, vou atirar-me com todas as forcas, com plena consciência de que vou ter que travar muitas lutas e que não vai ser fácil. Mas, com consciência também de que vai valer a pena.
 
 
Sentes que irá existir um "antes de ser mãe" e um "depois"? Quais pensas serem as diferenças e os maiores desafios?
 
Claramente, eu já sinto as diferenças e só sou “mãe em part-time”. Os maiores desafios são as dúvidas de estar a fazer as coisas certas…
As prioridades do teu dia mudam completamente… se queres ir ao supermercado, tens de planear isso quando ele não esta a dormir. Se vais sair de casa, tens de te assegurar que tens tudo o que ele possa precisar.
E, neste caso específico, as preocupações burocráticas são muitas…
 
A quem pretenda fazer férias num país imenso como a China, o que sugeres tu?
Como chegar até aí, o que visitar, onde ficar, o que comer...
 
Tive, recentemente, a visita de uns amigos que fizeram a viagem que eu
aconselharia: Beijing, Guillin e Shanghai.
Se tiverem oportunidade, visitem também Hong Kong e Macau.
Sugiro experimentar todas as cozinhas destes locais, por serem tão diferentes e variadas.
Quanto ao sítio onde ficar, depende… Sempre que viajo,  aqui na China, fico em Hostels mas, depende do tipo de férias que pretendes.
Quando fui para Sanya (eles chamam-lhe o Hawai da China), fiquei
num Hotel perto de praia porque queria mesmo relaxar…
 
O que te faz ser feliz?
 
Tu fazes perguntas difíceis… não sei exactamente… vou sabendo o que faz sentido a cada momento e, até hoje, não me tenho arrependido…
 
 
E assim ficamos a conhecer um percurso diferente de uma menina muito feliz!
 
Espero por vocês, na próxima conversa…
Até lá!
 
Inês